Fim de Semana do Prévidi – parte 2

 Um cara sensacional
Conheço o Hélio Fontoura, o Fontourinha, há muitos anos. Na década de 80 comecei a conviver com ele. Era repórter da Zero Hora e acompanhava o PDT. Fontourinha era um daqueles que estava sempre ao lado de Brizola.
Na sexta, recebi um e-mail da assessoria de imprensa da Assembleia gaúcha com uma entrevista dele. Gostei muito. É um trabalho da  Marinella Peruzzo, com a colaboração do jornalista José Almeida/Rádio Assembleia.
Acompanhe:
 Ex-deputado estadual pelo PTB, de 1963 a 1966, e secretário particular de Leonel Brizola durante quatro décadas, Hélio Fontoura esteve ao lado do líder trabalhista em todo o episódio da Legalidade. Ele é autor do livro “40 Anos ao Lado de Brizola”, no qual relata este e outros acontecimentos da história do Rio Grande do Sul e do Brasil. Nesta entrevista, aos 83 anos, ele conta como foi recebida a notícia da renúncia de Jânio Quadros e um pouco do que se sucedeu naquele final de agosto e início de setembro de 1961. Segundo ele, Brizola queria lutar até o fim pela Legalidade, mas Jango preferiu aceitar o parlamentarismo para evitar um banho de sangue.

No momento da notícia da renúncia de Jânio Quadros, onde o senhor estava e como se desenrolaram os acontecimentos?
Eu estava ao lado do doutor Brizola. Ele tentou falar com o Jânio Quadros, que estava na base aérea de São Paulo. Não conseguiu falar com ele, mas falou com o Castelo Branco, que era o chefe do serviço de imprensa. O doutor Brizola queria oferecer o Rio Grande, queria dizer que se houvesse pressão para a renúncia do Jânio Quadros, que ele viesse para cá, pois aqui se aguentava a mão. Mas não havia mais condições. A impressão que nos ficou é que o Jânio tentou simular essa renúncia para depois voltar nos braços do povo. Ele calculou mal, e aí não pôde mais voltar atrás.

O senhor, na época, não era deputado?
Eu era secretário do doutor Brizola. Comecei a trabalhar com ele na Secretaria de Obras Públicas, depois fomos juntos para a prefeitura de Porto Alegre, para o governo do Estado e depois para o exílio. E na volta também, no governo do Rio de Janeiro.
 
Como se seguiram os acontecimentos?

Quando o doutor Brizola percebeu que não tinha mais jeito e que os militares estavam pressionando para que o Jango não assumisse, ele conseguiu instalar a Rádio Guaíba dentro do Palácio. Formou a Cadeia da Legalidade e, a partir dali, começou a luta em favor da Legalidade, da democracia e da posse de Jango. Lamentavelmente, depois de alguns dias, os deputados se combinaram – inclusive o Tancredo Neves estava nessas articulações – e insistiram para que o doutor João Goulart aceitasse o regime parlamentarista.

Os senhores eram contra?
O doutor Brizola sempre foi contra. Nós acreditávamos nessa luta. Achávamos que, se o doutor João Goulart quisesse endurecer, haveria uma luta, haveria morte, mas a Legalidade venceria. Mas o doutor João Goulart, com aquele seu temperamento, não quis que houvesse um banho de sangue entre o seu povo e resolveu aceitar o regime parlamentarista, que deu no que deu.
Houve uma comitiva de deputados que viajaram a Brasília para relatar a situação do Rio Grande…
Eu nunca saí. Fiquei ao lado dele, no Palácio. Ficava de plantão. Inclusive, eu era caçador e trouxe umas armas minhas para o Palácio para ajudar na resistência. Mas não foi preciso.

Qual era a expectativa em torno da posição do 3º Exército (que depois se integrou ao movimento)?
Quando veio a notícia de que o comandante general Machado Lopes viria ao Palácio, a expectativa era de que o 3º Exército iria aderir à Legalidade, entretanto, não se sabia ao certo. Um episódio que eu conto no meu livro é que, a certa altura, quando se anunciou a vinda do general Machado Lopes para conversar com o doutor Brizola, o doutor Francisco Brochado da Rocha saiu do gabinete do doutor Brizola e passou por mim e disse: ‘Fontoura, estou preocupado, porque se o Machado Lopes não aderir, o Brizola vai prendê-lo aqui e eu não sei o que vai acontecer’. Mas, felizmente, o Exército, por pressão de outros generais legalistas, aderiu ao movimento.
 
E qual era situação do lado de fora do Palácio?

Apesar da ameaça de bombardeio, o povo não arredou o pé da frente do Palácio Piratini. A notícia  de que houve ordem dos militares para bombardear o Palácio fui eu que levei ao doutor Brizola, porque tinha um amigo que era radioamador em Pelotas – o Jorge Real – e ele, assim que teve a notícia, me telefonou e me deu os termos da mensagem do Exército para a base aérea bombardear o Palácio. Eu, em seguida, transmiti a notícia ao doutor Brizola e ele foi para a rádio e fez a denúncia.
 
Não era um boato, então?

Não, era para valer.

Sentiram medo?
Não! Nós estávamos empolgados na luta! Morriam todos, mas ninguém arredava o pé. Podia vir o que viesse. A liderança do doutor Brizola era uma coisa extraordinária. Era um líder da maior competência, ele tinha intuição, era impressionante.

Havia uma determinação das pessoas em se armarem? Houve, de fato, a entrega de armas pela empresa Taurus?
Todo mundo andava armado, e esses revólveres da Taurus foram distribuídos ao pessoal que estava no Palácio e aos que estavam nas imediações dispostos a defender o governo do Estado e a Legalidade.
 
Era um estado de guerra?

Era um estado de guerra, sem dúvida nenhuma.

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