Discurso do doutor Nelson Sirotsky, presidente da RBS, ao ser homenageado com o Prêmio Liberdade de Imprensa, durante a solenidade de abertura do 25º Fórum da Liberdade, em Porto Alegre.
Sobrou até para o nosso governador Tarso Fernando.
Leia:
Boa noite, senhoras e senhores
Liberdade de Expressão e Liberdade de Imprensa são irmãs gêmeas e filhas da Democracia.
O ministro Carlos Ayres Britto, que daqui a três dias estará assumindo a presidência do Supremo Tribunal Federal, costuma dizer que a liberdade de expressão e a liberdade de imprensa têm precedência sobre os demais direitos previstos pela Constituição, inclusive sobre a defesa da privacidade e da honra.
Quero chamar atenção aqui que o futuro presidente do STF considera que a liberdade de imprensa é um direito constitucional.
Então, ao contrário do que algumas pessoas pensam, não é um direito das empresas de comunicação nem dos jornalistas.
Para nós, a liberdade de imprensa é um dever.
A liberdade de expressão é um direito dos cidadãos, um direito de todos vocês, um direito de cada um de nós como indivíduos.
O Fórum da Liberdade, nos seus 25 anos, tem sido um desses momentos sagrados da Liberdade de Expressão, no qual cada orador pode dizer o que pensa e contar com a atenção de uma plateia qualificada – como ocorre aqui comigo agora nesta abertura do Fórum da Liberdade. É o que farei nos próximos minutos.
Primeiramente, gostaria de agradecer à direção do Instituto de Estudos Empresariais por me conceder tão relevante homenagem. Estou lisonjeado e recebo esse prêmio como uma homenagem para o Grupo RBS. É um reconhecimento aos nossos valores, cultuados desde a nossa fundação, em 1957. Entendo também que preciso agradecer aqui pelo trabalho que cada um dos 6 mil colaboradores da RBS desenvolve no seu dia a dia no aperfeiçoamento e na consolidação de uma cultura de excelência empresarial, de ética e de responsabilidade. É em nome deles que agradeço.
Quero usar também este momento de plena liberdade de expressão para com transparência compartilhar pensamentos sobre o tema e também para exercer meu direito de criticar.
Endereço aqui minha crítica mais contundente a todos aqueles que não compreendem a liberdade de expressão como uma liberdade essencial e que tentam diminuí-la e desmoralizá-la. Vejam o paradoxo praticado por alguns parlamentares no Congresso Nacional que, inconformados com a absoluta vigilância da imprensa livre do nosso país, com o intuito de retaliar, propõem leis absurdas que, se aprovadas, violam o princípio de liberdade de expressão. Por outro lado, há o artifício da criação de Conselhos de Comunicação, que nada mais são do que a mal disfarçada intenção de governantes de interferir no processo da livre comunicação.
Controle de informação não é assunto para o poder público. Neste sentido, lamento aqui, mais uma vez, a decisão do governo do Estado do Rio Grande do Sul de insistir na criação de um Conselho de Comunicação, cuja essência é incompatível com esse princípio de liberdade que estamos reafirmando hoje.
Quero aproveitar ainda este momento emblemático da liberdade de expressão para reafirmar um compromisso. O compromisso do jornalismo com a verdade, com a ética e com a transparência. O compromisso particular do Grupo RBS com os interesses e as necessidades dos seus públicos.
Nosso Guia de Ética e Autorregulamentação Jornalística é uma espécie de contrato de transparência da empresa com seus leitores, telespectadores, ouvintes e usuários de nossos serviços nas novas plataformas digitais. São orientações internas para nossos jornalistas e comunicadores, com o propósito de garantir a qualidade, a isenção e a utilidade das informações e serviços que oferecemos aos nossos públicos. São também mecanismos transparentes de formas de acesso do público a nossos profissionais e veículos de comunicação.
A palavra autorregulamentação entrou definitivamente no nosso vocabulário e significa o exercício da liberdade de expressão na sua plenitude, mas com a responsabilidade que este exercício requer. Na RBS, isso não é retórica. É prática nos nossos comitês, nas nossas redações, no nosso processo diário de levar ao público informação independente e plural.
Quero aproveitar este momento de liberdade de expressão para manifestar minha confiança na democracia brasileira.
Como não confiar numa democracia que deixou para trás o autoritarismo, o atraso e a miséria crônica? Como não confiar numa democracia que superou crises econômicas e já nos garante, por 18 anos consecutivos, moeda estável e inflação controlada? Como não confiar numa democracia que derrubou a Lei de Imprensa e nos contemplou com avanços legislativos inegáveis, como o Estatuto da Criança e do Adolescente, a Lei Maria da Penha, a Lei de Responsabilidade Fiscal, a Lei da Ficha Limpa e agora mesmo a Lei de Acesso à Informação Pública, que pretendemos seja efetivamente cumprida a partir de maio, data de início da sua vigência, pelos órgãos públicos dos três poderes no âmbito federal, estadual e dos municípios!
Como não acreditar numa democracia cuja imprensa denuncia com a mesma ênfase um escândalo como o do Mensalão, que envolveu políticos ligados ao governo, e um episódio como o do senador Demóstenes Torres, até então uma das lideranças mais fortes da oposição?
Quero aproveitar este momento de liberdade de expressão para defender a imprensa livre como um dos sustentáculos desta democracia. Por isso volto ao tema da tentativa de controle sobre a mídia, que de vez em quando governantes, legisladores e magistrados tentam ressuscitar.
O melhor controle da imprensa – disse outro dia a própria presidente Dilma Rousseff – é o controle remoto, que permite aos cidadãos selecionar o que desejam ver ou até mesmo desligar os aparelhos que lhes dão acesso a conteúdos jornalísticos e ao entretenimento. Estou convencido de que ninguém, a não ser o próprio público pelo livre processo de escolha, tem o direito de controlar a informação.
Decisões judiciais, em caráter liminar, que proíbem antecipadamente a divulgação de determinada matéria, nada mais são do que um ato de censura. Propostas de legislações que procuram garantir o legítimo Direito de Resposta, que a meu ver deve ser tratado diretamente entre as partes, também nada mais são do que mecanismos inibitórios à livre expressão e à liberdade de imprensa. O projeto de lei 141, de 2011, proposto pelo senador Roberto Requião é um exemplo objetivo deste tipo de distorção.
Se me permitem, caros amigos, gostaria de aproveitar este momento para reafirmar que a liberdade de Expressão e a de Imprensa não precisam de mais leis e regulamentações.
Temos leis suficientes que permitem, diante do impasse, que a via judicial possa ser acionada em última instância para resolver questões relacionadas à liberdade de expressão e de imprensa. Nossa Constituição é suficientemente clara ao definir de forma inequívoca que “é livre a expressão de atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independente de censura ou licença”.
Felizmente temos também homens lúcidos como o já mencionado futuro presidente do STF, que, ao participar recentemente aqui em Porto Alegre do Programa Painel RBS, enfatizou: “A Constituição é a lei orgânica sobre liberdade de imprensa. Nenhuma outra lei pode ter a pretensão de conformar a liberdade de imprensa. Não pode haver lei dispondo sobre o tamanho e a extensão da liberdade de imprensa, e sua duração.”
Senhoras e senhores, encerro esse momento especial compartilhando com vocês o preâmbulo da Declaração de Chapultepec, documento aprovado pela Sociedade Interamericana de Imprensa em defesa da liberdade de expressão que sintetiza bem o sentido do meu agradecimento por esta homenagem que muito me orgulha:
“Somente através de livre expressão e circulação das ideias, da busca e difusão de informações, da possibilidade de indagar e questionar, de expor e reagir, de coincidir e divergir, de dialogar e confrontar, de publicar e transmitir, é possível manter uma sociedade livre. Só mediante a prática destes princípios, será possível garantir aos cidadãos e grupos seu direito de receber informação imparcial e oportuna. Somente com a discussão aberta e a informação sem barreiras, será possível buscar respostas para os grandes problemas coletivos, criar consensos, permitir que o desenvolvimento beneficie a todos os setores, exercer a justiça social e prosseguir na obtenção da equidade”.
O tema desta 25ª edição do Fórum da Liberdade é uma visão para o Brasil nos próximos 25 anos. Como todos vocês, espero um país melhor, com menos desigualdade, com mais educação, e, por consequência, com mais desenvolvimento. Espero ainda uma sociedade democrática que encontra a liberdade de expressão e a liberdade de imprensa entre os seus valores mais sólidos.
Finalizo dizendo que o Fórum da Liberdade, ao reconhecer a cada ano o Prêmio de Liberdade de Imprensa, dá também a sua extraordinária contribuição para a causa e orgulha profundamente aqueles que, como eu, têm o privilégio de receber esta homenagem.
Muito obrigado!